sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

A humanidade gerou o Estado. Deve, pois, educá-lo condizentemente.

O primeiro texto é abstraído pela capacidade intrínseca de cada ser humano, quando intenta externar suas ações por meio de mecanismos lógicos que, organizados pelo espírito, evidenciam uma manifestação no sentido de causar alguma coisa, como se toda a causa humanamente originada perseguisse a ordenação de todos os efeitos possíveis, esquecendo-se de si, enquanto efeito primordial, desatento quanto à causa que lhe determina o movimento.
Esse texto existe a partir da mobilização de uma vontade, e cria, na medida de suas limitações, um espaço para manifestação. Não fosse o potencial humano para produzir efeitos, essas linhas estariam dormitando na terra do nunca e não existiriam, exceto no imaginário de seu autor. Esse texto quer provar-se existente e, sem uma humanidade, sequer poderia ser imaginado. Num texto assim, gerado expontaneamente a partir de uma vontade, nada se poderia inferir, exceto o fato que aponta para a proposição de que o homem é o único animal capaz de manipular efeitos, combinando-os indefinidamente, à mercê da relação que estabelece com toda a humanidade possível, humanidade que cria a partir do que percebe e repete-se no que não percebeu, porque o homem cria para o homem e para mais ninguém.
Dentre tantas maravilhas geradas pelo imaginário humano, as ficções são, talvez, as filhas mais intrigantes da imaginação humana. A ficção literária cria e dá forma a algo que, inexistente na concretude dos sentidos, existe, todavia, no interior das almas, por isso alimenta a fome pelo que há de impossível no coração das pessoas. A ficção científica, no mesmo sentido, organiza possibilidades com o pressuposto de que se trata, não de uma mentira, mas de uma probabilidade ainda não materializável, incentivando a alma humana na busca da platônica configuração possível do existir e do ser. A ficção jurídica segue pela mesma esteira. Cria conceitos e verdades temporais que se projetam no território da imaginação, determina sua genetriz e a produção dos efeitos projetados pelo corpo social, traduzidos pelo seu consciente coletivo, empresando-lhe a sensação de existência real, tão bem articulada que constantemente é deificada pelas pessoas que a alimentam como algo, claro, distinto de si mesmas.
O homem criou o Estado - ficção jurídica por excelência. Deu-lhe uma forma e regeu sua estrutura significativa no sentido do bem comum. Mas apesar do fundamento existencial que determinou a criação desta figura abstrata, não se nota que a produção dos efeitos pretendidos se evidenciam na vida real de seu criador. A figura, em via de mitologização, ganhou vida própria e , de criatura, passou a ser criadora, ditando regras, criando, sempre virtualmente, realidades potenciais. O Estado, graças à intervenção de uma parcela da mesma humanidade real que o gerou, produziu efeitos que não consubstanciam o bem comum, finalidade precípua do Estado.
Essa mesma parcela da humanidade, que passou a integrar o Estado, vivificou o que havia de imobilizado na ficção, fazendo confundir o Estado com aqueles que o integram, como se o abstrato e o concreto fossem, de alguma forma, a alma e o corpo de toda a sociedade. Essa confusão aos poucos foi alimentando esse monstro deformado que, criado para sustentar a organização social do homem, passou a querer dirigí-lo e obrigá-lo a retroalimentar o sistema que o mantém "vivo", no imaginário coletivo de todos os segmentos sociais.
Genetriz significa "aquilo que gera", "matriz" , "mãe", e este espaço cibernético existe para nos lembrar quem criou quem. O Estado é a criatura e não o criador. Deve obedecer e não exigir obediência. Deve, pois, proceder com temor reverencial aos seus pais, nós, que consciente ou inconcientemente, o alimentamos fartamente , sustentando os seus objetivos, não a sua existência em si mesma. Genetriz Estatal existe para lembrar que é o homem quem é o senhor do Estado, num contexto em que este pretende divinizar-se perante o seu próprio criador. Genetriz exige o respeito estatal. Que a providência divina nos auxilie neste particular mister: reconfigurar a mente do homem para que restabeleça o controle sobre a sua criação, reintegrando-se a idéia de que o Estado existe para subsidiar o bem comum, não a sua subsistência em si mesma, inútil se assim configurada. Sejam bem vindos a si mesmos na interação com esse espaço, que como se propugnou no início desse texto, definiu-se como um útero maduro e aberto para novas fertilizações, aguardando toda e qualquer manifestação que contribua para reforçar na memória coletiva da sociedade brasileira, que foi o homem quem criou o Estado, e não o contrário.