quinta-feira, 17 de setembro de 2015

DEMOCRACIA: O TODO É O RESULTADO DA SOMA DAS PARTES E NÃO O CONTRÁRIO.

     Após o advento da nova ordem constitucional inaugurada em 1988, a democracia caiu no gosto no brasileiro. Faz parte do espírito do povo (enquanto elemento do Estado) brasileiro repudiar qualquer forma de limitação da liberdade. Nossa ancestralidade é prova histórica dessa acepção. Os primeiros habitantes do país preferiram se aventurar pela floresta, subindo o território em que habitávamos (posteriormente concebido como nacional) dirigindo-se ao norte ou adjacências. Precisamos recuperar o norte do estado de coisas em que fomos inseridos. Recordemos que as verdades migram pelas gerações e que o mundo sofre transformações numa velocidade descomunal, horizontal e verticalmente falando. Concebemos como horizontal o fluxo de informações e valores que se estendem no tempo e no espaço, atingindo os limites do globo. Como vertical, o plano das cogitações oriundas de um processo reflexivo profundo de identificação radical - no sentido de raiz - para saber, antes das tendências que simulam valores, vertendo possibilidades, da essência que aglutina milhões de pessoas dentro de um território, em busca de um conceito de nação mais refratário.
     Arroz com feijão, para mantermos a brasilidade, pode refletir uma dieta eficaz contra a anemia do consciente coletivo em face da ignorância que alimenta a irrefletida falta de memória das gerações em relação aos seus valores. Uma paradinha para meditarmos e adentrarmos na alma nacional.
     O espírito que vivifica os valores que, queiramos ou não, florescem no ambiente subconsciente da nação precisa ser redescoberto. O que é democracia? 
    A unidade nacional prescinde de regras de convivência que permitam que a sociedade progrida e desenvolva a sua própria fórmula para fomentar sadiamente o seu crescimento. O Estado existe para promover o bem comum, entretanto, o que poderia ser reputado comum num espaço onde convivem milhões de pessoas nascidas em contextos sociais distintos, regiões geográficas diferenciadas e formação genética e cultural diversificada? Há que se lembrar, fenômeno não raras vezes olvidado do processo de integração nacional, que Estados foram instituídos para servir ao corpo coletivo identificado a partir do somatório de todas as diversidades,  representam serem humanos, não máquinas que devem ser programadas para pensar de uma única e exclusiva forma. A robótica e a inteligência artifical pertinem a outro ramo do conhecimento. 
     Para que se compreenda a democracia é preciso começar do mais simples: Reconhecer a existência de diversidades (e respeitá-las). A grosso modo, exercitar a compreensão quanto às distinções pessoais é compreender que a liberdade, o atributo maior da alma humana, habilita-a a exercer escolhas a partir de critérios e valores pessoalmente construídos. O chamado livre arbítrio.
     Quando a liberdade é tutelada pela Constituição Federal, não se quer, com isso, outra coisa senão impedir que o senso de escolha seja violado por outros elementos senão através da perfeita ou imperfeita construção da consciência em busca da compreensão das exterioridades (governos, partidos, associações, lei, religiões, dogmas e demais consubstanciações de valores pessoais) e das interioridades (traumas, medos, rancores, valores repassados pelos ascendentes, etc). Quando se cria uma regra e ela é democraticamente construída, deve-se, antes de qualquer coisa, compreender a inexorabilidade das distinções e das individualidades. Não somos iguais a ninguém: essa é maravilha da existência. O todo se compõe de suas partes, sendo tolice admitir o contrário, ou seja, que as partes são formadas pelo todo. Viva a matemática, regra inexorável que para ser modificada precisa apresentar premissas melhor estruturadas, diga-se de passagem, demonstradas.
     Das individualidades emergem interesses e esses interesses são colocados em xeque quando bem compreendido o processo de elaboração das regras. Há regras de superestruturas (regras de como formular regras) que devem ser conhecidas de toda a população. Numa analogia mais ou menos grotesca, não conseguiríamos imprimir as letras que compõe as palavras que poderiam explicitar em maior ou menor grau a nossa ideia, se não dominássemos a língua. Posso usar a palavra errada no local errado, imaginando ter expressado esta ou aquela ideia, mas ao fazer uso de um código comum (sistema de línguas: português), não posso alegar ter sido mal compreendido se não me dei ao trabalho de conhecer o sistema de regras que organizam o código de linguagem de que faço uso para tanto. Como poderia programar um sistema de informática sem conhecer o sistema de linguagem de que o meu computador se utiliza para compreender o que desejo programar? Como fazer uma planilha de cálculo sem compreender as regras matemáticas postas em movimento na tentativa de configurar valores? Qual é, afinal, o código da alma humana e como se explicitar, com algum grau de ciência, o sistema anímico dos homens no processo de catalização de sua energia no mundo das manifestações?
     Voltemos ao velho e saboroso arroz com feijão.
     Podemos não ter um consenso sobre o que é bom, mas temos uma grande experiência em saber o que nos faz mal. Medo, fome, guerra, desordem, ignorância, violência, dúvida, mentira, etc., são maus majoritariamente reconhecidos Mas o que isso tem haver com o tema dessa semana? Tudo. Assim imaginamos. Assim pensamos. Assim formulamos. Assim cremos. Assim nos expusemos ao senso crítico do outro - as outras parte do todo. Assim nos aprimoramos Assim seja!
     A primeira iniciação ao espírito democrático dos povos está representada pela consciência de que somos livres, É tão assustador que, no plano institucional, não raras vezes inibimos nossa potencialidade, estritamente coligada com nossa liberdade, para nos escondermos numa ideia de coletividade deformada, inclusive sob o prisma psicológico. O Estado, nesse sentido, ao invés de incentivar, com  plenitude, o espírito dos homens que busca organizar, visando ao processo evolutivo da espécie, aprimorando e estimulando sua liberdade, confiando no bom senso de todos, acaba por engendrar um sistema legal asfixiante, promovendo a instituição de milhares de regras que só fazem violar possibilidades. Quanto mais o Estado é instituído com base no medo, maior o número de regras com as quais se acorrentam possibilidades.
     Filha mais velha da liberdade, a verdade deveria capitanear o nascimento do Estado, auxiliando-se com ferramentas das quais jamais se poderia abrir mão, como a razão, a lógica, a experiência e as ciências. Um Estado pautado na mentira nasce morto. É impossível manter-se regulando o corpo social se os postulados que subsidiaram a sua existência forem incompatíveis com a experiência humana, a razão e a lógica. Para começar, admitindo a hipótese de que o Estado substitui as individualidades para materializar valores comuns, desprovido de verdade desde as suas bases, qual seja, instituído e mantido para fins distintos, seria utilizado por uma minoria que tentaria impingir a uma maioria uma verdade que só existe no imaginário de que o detém em poder. Se fosse hábil na manipulação da verdade, buscando institucionalizar uma mentira, tentaria cooptar a sociedade por cerca de três gerações. Há países em que o chefe de Estado é venerado como um deus, não porque as pessoas sofram de idiotia profunda, mas porque a verdade ensinada é lastreada em premissas falsas, ensinadas às novas gerações (nas escolas estatais demais), sem a contrapartida do exercício lógico, como coisas apreendidas em concepção pelos seus avós e pais. Ainda assim, por ser lastreado numa mentira coletivizada, gradativamente seria desmantelado pelo tempo. Não tardaria a população a descobrir o engodo a que foi submetida e isso por uma questão tão simples quanto irrefutável: Não há regra de direito que consiga elidir (ou revogar) as regras da alma humana e o senso de percepção que dela emerge sempre que se notar que o Estado mente, sobretudo quando mente descaradamente.
     Aprimoremos nossa democracia vitalizando o senso das individualidades. Alguns gostam de carne de porco, outros de salada. Não é o gosto por um ou por outro que sustém o processo democrático, mas o fato de que todos podem gostar do que gostam. Na adversidade, somente o que é comum, em sede de valores deve prevalecer. Individualidades refletem interesses pessoais. Devem ser manifestas para serem conhecidas e se fazerem representar no jogo de forças que constitui a dinâmica do Estado democrático, entretanto, os interesses individuais somente podem prevalecer quando forem identificados com valores comuns. O Soma resultante do fenômeno da externalidade de interesses, determinam sua proximidade e influência no que pode ser definido como, num primeiro momento, interesse comum, e, num segundo momento, após sua submissão ao crivo da análise crítica da sociedade (esta como efeito da soma das individualidades), como BEM COMUM. Via de regra, num sistema democrático, o bem comum é sufragado pela maioria das pessoas. Então pode ser convertido em regra (lei) que será obedecido. Indague a maioria das pessoas se poderia ser permitido matar os seus filhos e terá uma noção do que é bem comum e do senso do que é majoritário que se pretende imprimir nessa reflexão. Somente esse interesse deve ser regulado pelo Estado. Mais do que isso é uma intervenção indevida nas individualidades de que se compõe o seu substrato existencial.
     Perdi no sufrágio e a regra (ou o fim que ela almeja) foi reputada bem comum. E agora? Ela respeita os princípios acatados por todos na lei fundamental? Sim! Devo me submeter a ela. SIM. Pressuposto: que a Constituição tenha sido formulada por princípios reconhecidamente afinados com o bem comum e que as regras de superestruturas (regras de como formular regras) tenham sido erigidas pela mais ampla liberdade, à luz da verdade do que há de comum nas partes de que o todo, a sociedade, vêm aprovar.
     Somente o bem comum deve ser objetivado pelo Estado fundamentado na liberdade e na verdade.
    Para você que pode ter pensado que a verdade é relativa, uma sugestão: repense o conceito de comum.      
     O que você come, bebe, como se diverte, suas preferências, estilos, conceitos, não nos interessa, exceto pelo fato de que devem ser seus e administrados, nos efeitos que produz, por você mesmo. Não é comum, ainda que guarde alguma similaridade com o gosto da maioria. Do contrário, se fosse identificado por estatística que um refrigerante é adorado pela maioria da população, ter-se-ia que tutelar o seu consumo por meio de regras estatais. Bem comum é outra coisa.
Para você que pensa que o bem de sua concepção não é outra coisa senão o bem da sua concepção, fantasiando possibilidades e sonhando com o dia em que todos terão o mesmo senso de percepção sobre o que é bem ou sobre o que é comum, conforme destilado pela sua imaginação, resta o exercício da convivência com a diversidade. 
Aos demais, fiquem tranquilos. Quando o Estado promove o bem de poucos em detrimento do sacrifício da maioria, ele é desmantelado, ora pelo próprio senso de percepção coletivo, ora pelo seu ostracismo existencial, consequência natural de todo o processo de putrefação
O voto (quando não fraudado o sistema de apuração) é a principal arma da sociedade contra todo e qualquer Estado que age com vilania, esperteza e menosprezo ao senso de percepção geral. 
Tenha coragem de ser você mesmo em seus valores. O Estado depende de sua individualidade para subsistir, ainda que isso possa lhe parecer paradoxal ou contraditório. 
A soma das partes é que faz o todo. Seja a parte que lhe toca. 
Toca aqui cara! Sejamos, pois!