sexta-feira, 7 de maio de 2010

Se os criadores do Estado ressuscitarem, recorrerão à psicanálise.

Certa feita me deparei com uns livros velhos e, folheando-os, deparei-me assustado com parte dos conteúdos embotados pelo amarelo que todo o tempo faz desprender. Para não me tornar exautivo, cito apenas alguns deles:

"Capítulo X - Do abuso do governo e seu pendor a degenerar. Assim como a vontade particular atua incessantemente contra a vontade geral, também o governo esforça-se continuamente contra a soberania. Quanto mais esse esforço aumenta, mas a constituição se altera; e como não há aqui outra vontade que, resistindo àquela do príncipe, venha a equilibrá-la, deve acontecer, cedo ou tarde, que o príncipe oprima finalmente o soberano e rompa com o contrato social" (Jean Jacques Rousseau: in 'Rousseau: do contrato social e discuros sobre economia política, Ed. Hemus, SP)

Meditando sobre esta frase e puxando pela memória, recordei-me que para Rousseau, célebre autor da obra popularmente conhecida por "do contrato social", o "soberano" é a sociedade ou o povo política e juridicamente organizado (a síntese da vontade geral). O príncipe o personagem que dirige o "governo"; o contrato social, o instrumento (pacto) que autoriza ao "príncipe" dirigir a vontade do "todo" , através de atos de uma pessoa que governa o soma das vontades individuais, colaborando com sua organização e harmonizando suas eventuais contradições individualizantes, sempre em harmonia com a vontade do soberano (sociedade organizada), visando ao seu bem comum.

Quando o filósofo alude à pressão do governo contra a soberania (expressão da vontade coletiva de todos), e prevê que o príncipe, confundido a sua vontade com a vontade geral, mas sem representá-la de fato, tende a fazer romper o pacto social representado pelo elo que une uma coisa a outra (vontade geral - o soberano - e vontade do príncipe: então súdito), fazendo imperar a inversão de valores e a distorção do nexo ou vínculo de representatividade, fiquei assustado com as coincidências intertemporais.

Quando esse pequeno texto é lido com atenção, nota-se que Rousseau, um dos primeiros consolidadores da forma do Estado moderno, alenta com eficiciência extraordinária , eu diria, quase profética, acerca da probalidade do contrato social ser rompido pela pressão que o príncipe (que dirige o governo e deveria representar a vontade do soberano: vontade geral) exerce impondo a sua vontade pessoal, em detrimento de todas as demais vontades.

Chama a atenção de forma ainda mais impressionante, a expressão utilizada para identificar o fenômeno que determina, enquanto efeito, a pressão do príncipe (governo) contra o soberano (vontade geral). Ei-la reproduzida: "Quanto mais esse esforço aumenta, mais a constituição se altera". Mestre é sempre mestre. Isso foi escrito em meados do século XVIII.

Hoje, vivemos sob os auspícios da obrigatoriedade pelo respeito a um pacto que, sendo jovem (1988), já foi alterado mais de sessenta vezes. Eu disse: "mais de sessenta vezes". "Quando mais o esforço do príncipe aumenta para impor a sua vontade, mais a Constituição se altera", reverbera nos porões da alma coletiva do mundo, o alerta acerca do que ocorre no Brasil, que teima em andar na contramão da história.

Para se alterar a Constituição Federal (o nosso contrato social escrito), é necessário um procedimento que exige quorum qualificado. O constituinte (o órgão que foi instituído para introduzir no território nacional uma nova ordem jurídica), quando preconizou uma condição especial e qualificada (quorum) para que se pudesse alterar o pacto nacional, imaginou que somente as matérias reclamadas pelo soberano (vontade geral) seriam passíveis de sofrer alteração, pois a referida alteração (via Emenda Constitucional), implicaria na mobilização das duas casas do Congresso Nacional (Senado e Câmara de Deputados), e a sua aprovação por maioria qualificada, ou seja, em dois turnos com aprovação de 3/5 em ambos os turnos.

Como o Senado representa as unidades do pacto federativo (Estados) e a Câmara dos Deputados a população, é fácil constar (no campo hipotético) que somente quando a sociedade pressionasse os poderes, é que as propostas por mudança no texto constitucional se evidenciariam. Mas elas vieram em cascata (sequência... para não pensarem que se alude a cascata enquanto expressão que alude à mentira), e o pacto foi alterado como se altera uma lei comum (por isso chamada ordinária, sem trocadilhos). Rousseau alertava: quanto mais a pressão do príncipe aumenta, mais a Constituição se altera . O alerta de Rousseau vale para os morimbundos de plantão: o principe se dissociou da sociedade, e, ao que parece, não pretende se reconciliar com o verdadeiro soberano, no dizer de Rousseau: a vontade geral. (ou será que a vontade geral deseja isso, dada a completa omissão com a qual se comporta?)

Valeria, diante disso, apostar na proposição de Montesquieu, percussor do modelo atual tripartite (legislativo, executivo e judiciário), quando afirma que "Cumpre seja o Povo julgado pelas leis, e os grandes pela fantasia do Príncipe; que a cabeça do último dos súditos esteja em segurança, e as dos Paxás sempre expostas"?

Mas se todos eles, na sua época, apontaram para possibilidades de corrupção no sistema, pela deformação da vontade geral, em homenagem à vontade do príncipe, enquanto este brinca de poder com o nosso Poder, como explicar o que se verifica em pleno Século XXI, quando reproduz a circunstância alertada em pleno século XVIII?

O tempo é relativo e até pode ser curvo, mas não exageremos na deformação daquilo que o ululantemente óbvio reclama: Os Poderes da República foram deformados pelos vícios implementados pelos corruptores e corruptos que se abrigam sob a égide do conceito de Estado, que devendo ser Estado, tem estado no estado catatônico de algo qualquer que quer que tudo se dane, inclusive o conceito, o Estado, a vontade geral, e qualquer outra coisa que não seja a vontade de um símio e a do grupo correlato que vem a comandar, a pretexto de poder, o circo montado para a alegria dos incautos, débeis mentais e desestimulados políticos, nominando sucesso político a capacidade de corromper macacos em fase de desenvolvimento que se elegem sem que se possa compreender como ou porquê, bestas imbecilizadas que mal sabem falar o português corretamente, tudo porque o magma psíquico sedimentado pela circunstância ensina crianças a pensar que um cérebro intelectualmente deficiente, em nome da igualdade, pode mesmo governar um país de dimensões continentais, a pretexto de igualdade, sob o sofisma de uma doentia propalação de um socialismo esquisito, que dá a cada cidadão, a parcela de ignorância que lhe cabe. Eu passo!!!!

Por via das dúvidas, fico com Nietzsche, quando afirma que:

Estado chama-se o mais frio de todos os monstros frios. Friamente também ele mente; e esta mentira rasteja de sua boca: 'Eu, o Estado, sou o povo'[1].


[1] In "Assim Falou Zaratustra: Um livro para todos e ninguém.”

Por via ainda mais das dúvidas, fico comigo mesmo, quando digo: "Volta Rousseau! Volta Montesquieu! Volta Nietzsche! Volta você que nem sequer foi!! Volta você que me lê! Volta, você que não me leu! Volta a volta dos que não foram.....ludibriados pelo sistema"!!!!