quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

A LIBERDADE, A MESA E O BIFE: OU: PROTEJA-SE CONTRA A SUA LIBERDADE!

     Do seu ponto de vista, quem é esse que lê essa postagem nesse exato momento? Que certeza possui de que a resposta aproxima-se com considerável grau de precisão da realidade, conforme a opinião dos outros? E, afinal, de que vale a opinião dos outros se você estiver convicto acerca da natureza da alma que está por detrás dos olhos que acompanham o desenrolar de nossas ideias, ainda que o dia não tenha sido tão bom assim?
        Genetriz Estatal observa atentamente o desenrolar dos fatos que vem ganhando corpo no mundo. São muitas as manifestações em favor da liberdade bem como diversos os conceitos que a definem.
       Não poderíamos exercer o nosso direito ao silêncio e ao distanciamento do mundo enquanto as vozes fazem jorrar expressões de liberdade aos borbotões, em países tradicionalmente afeitos ao silêncio e ao silenciar de todas as considerações?
        Poderíamos sim, mas não queremos. Entre as palavras, o querer e o que se quer, há várias pontes que ligam intenções, objetivos, sentidos e desilusões. As mesmas pontes podem conduzir, ao mesmo tempo,  à alegrias inefáveis e tristezas abjetas. Somos livres para escolher o que falar ou como ouvir. Somos livres, ainda, para decidir calar ou fechar os ouvidos às idiossincrasias do mundo moderno. Alguns as reputariam, em algum grau, "indiossincrasias". Se não der pau vai comer!
        No processo de formação de qualquer ente estruturado para regular a vida em sociedade, uma das faculdades mais respeitadas é a liberdade, em seu sentido mais amplo. O princípio da liberdade é regulada pelas Constituições modernas sob diversas matizes: para ir e vir ou permanecer; para escolher como reverenciar o seu Deus ou os seus deuses (liberdade religiosa) e mesmo para jamais pensar sobre isso; para se associar o permanecer associado (liberdade de associação), para se sindicalizar ou não se sindicalizar; Para se reunir em locais públicos desde que não frustre reunião anteriormente designada (liberdade de reunião); A liberdade é a mãe de todas as faculdades humanas. Seus filhos variam como variam as estrelas no céu.
       Para nós, importa, nesse momento, desenvolver nossa compreensão acerca da liberdade de imprensa, de opinião, de expressão (artística, cultural ou política). Daremos tratamento similar a estas forma de expressão humana.
          O próprio Estado não poderia existir, enquanto instrumento de pacificação social e progresso, não fosse a liberdade desfrutada pelas pessoas no sentido de criar regras gerais de convivência e organização da coisa comum, finalidade precípua do Estado. Se alguém proibisse o exercício da liberdade, estaríamos ainda na idade da pedra, mordendo-nos a cauda a cada  desvario individual: não sobraria, às vezes caudas, às vezes dentes.
         As chamadas cláusulas pétreas, garantem a liberdade de alteração das regras constitucionais, exceto daquelas que se constituem em verdadeiras colunas do Estado Democrático de Direito. Inclusive a garantia e primado da própria liberdade.
           Países como a França e os Estados Unidos da América são vanguardistas no conceito, tomado em seu  caráter universalista. As primeiras declarações universais são testemunhas desse fato. Para a nossa alegria, a liberdade foi um dia concebida como atributo humano.
          É mais ou menos estatístico que em países onde ela é minguada - a liberdade - as forças que propugnam pela sua manietação ocultam disfarçados propósitos de controle, escravidão e conservação de toda a espécie de ignorância possível. Inclusive a pior delas: ignorar que  ignora.
        Que certeza você tem de que vive em um país verdadeiramente livre? Há, no processo de ambientação do estabelecimento das liberdades, múltiplas formas de deturpar o sentido das coisas.                Certa vez, conversando com uma conhecida, ela narrou que seus pais a amarravam na perna da mesa enquanto saiam para a labuta na lavoura, temendo pela sua segurança. Seus pais desejavam o seu bem (a sua segurança e integridade física) e haviam aprendido esse comportamento através de seus pais (os pais dos pais), imigrantes estrangeiros que se refugiaram da segunda guerra mundial no Brasil.
       No Brasil, a ideia de liberdade nasceu deformada. Amputaram-lhe os membros já em seu nascedouro. Melhor ilustrando: retiraram o que havia em seu DNA.
          A liberdade não é um direito constitucional. Nem objeto de elucubrações inúteis nos foros onde se reúnem intelectualóides de quinta categoria. Não se ensina nas escolas. Uma vez que possa sofrer o arbítrio de uma orientação, já deixou de ser liberdade. Liberdade é um atributo da alma humana. Humana, fazemos questão de frisar.
         Um país em que o sistema de difusão de notícias e comunicação recebe verbas do Estado jamais poderia se reputar livre. Basta o governo ou o grupo de poder ameaçar cortar verbas publicitárias e outras vantagens (diretas e indiretas) que a revelação dos fatos, encampados pelo ato de noticiar, distorcem a realidade que nos cerca, seja para enfeitá-la com doces e coloridos confetes, seja para azedar possibilidades. Tudo vai depender do preço e do interesse movimentado na relação entre imprensa e Governos . Poder e imprensa não combinam. Verdade e liberdade de expressão sim.
          As palavras são poderosas armas de distorção da realidade. Desde a sua escolha até o timbre de sua expressão nos telejornais, sobretudo em horário nobre,há uma criteriosa manipulação de seu uso, bem como dos efeitos que pretendem com sua produção. Mas as mesmas palavras são também poderosas armas de difusão de todas as verdades.
        Confundem a população quando, a pretexto de defesa da liberdade de expressão, utilizam da expressão como forma indireta da afetação da realidade, promovendo distorções como forma indireta de diluir a liberdade no conta-gotas das verdades parcializadas, ocultadas em termos ou da  mentira ventilada em pequenas e homeopáticas doses. Quando se pretende divulgar inverdades, recorrer-se ao direito de livre expressão como se esse direito não tivesse que sofrer o crivo da ponderação de outros direitos, como o da imagem, da tutela da personalidade e o da defesa da honra. Proceder assim é modificar o sentido ontológico da expressão que a ideia de liberdade faz encampar.
      A liberdade de expressão (gênero) não pode ser tabulada por critérios lógicos que possam determinar os contextos das  intencionalidades ou tendenciosidades exercidas pelo homem por qualquer meio em que possa se exprimir. Isso, por vias indiretas, seria determinar o conteúdo das expressões possíveis, na razão em que possam agradar aos censores do príncipe, controlando o que pode ou não pode ser manifestado pela alma no tempo e espaço de sua atuação no mundo. Seria o equivalente a garantir o direito de se exprimir desde que seja a favor de quem imagina poder controlar considerações interiores e impedir que sejam conhecidas. Um assassinato de possibilidades futuras.
          Jamais se pode confundir o direito de se expressar com a responsabilidade por exercê-lo. Dizer, de um lado, que a liberdade pode ser cerceada a pretexto da segurança da imagem e da honra, e, de outro, que deve ser irrestrita senão não é liberdade, é confundir, como diz o ditado popular, "bife ali na mesa" com "bife à milanesa".
         A liberdade, por ser atributo da alma humana - e somente da humana alma - jamais poderá ser cerceada a pretexto algum. Podemos desobedecer as leis e a Constituição, as regras sociais e os costumes, porque somos livres. Não há norma, expressa ou tacitamente aceita, que pode aprisionar um atributo da alma humana. Por isso Presidentes se elegem apesar de tudo.
       No Estado Democrático de direito, a lei é a fonte de obrigações relativas a qualquer dos comportamentos sociais factíveis Quando determinado comportamento, por ferir o senso médio relativo a um valor da sociedade, em um dado momento no tempo e no espaço, for reputado tão infringente a um  valor socialmente consolidado (honra, imagem, patrimônio, etc.), essa sociedade se mobiliza, por meio de seus representantes políticos, pressionando-os a tipificar o comportamento como reprovável e, portanto, passivo de sanção, por meio da atuação do Judiciário.
       Sancionada a lei, convalidando o senso de reprovação da sociedade diante de tal comportamento, estabelece-se uma sanção para a hipótese de sua ocorrência. Isso queridos leitores, é legalidade. Mais do que isso. Isso é regular a produção dos efeitos relativos ao exercício da liberdade, o que implica em dizer que a liberdade permanece intocada (não se pega o ar com as mãos do poder), mas se vier dar existência manifesta aquele comportamento que a sociedade passou a repudiar - criminalizando-o - como ocorre com a calúnia (imputar fato criminoso a outrém), difamação (imputar fato de repercussão social negativa mas que não constitui crime) ou injúria (ofender a imagem ou honra pessoais, sem repercussão espacial ou conhecimento de terceiros), a lei determina responsabilidades ao autor da conduta.
       Qualquer tentativa de cercear a livre manifestação do pensamento ou expressão é vã e a iniciativa nesse sentido sempre será natimorta.
        No que toca, pois, a consequência do exercício da liberdade, em sua manifestação no mundo e para o mundo, no processo de interação entre liberdades exercidas por pessoas distintas e, não raras vezes conflitantes, o assunto é diferente. Havendo dano ou prejuízo causado pela manifestação do atributo da liberdade, em qualquer de suas modalidades,  observados os preceitos constitucionais, esse dano pode (e deve) ser indenizado se houver ação da parte ofendida nesse sentido.
         O fato do bife estar ali na mesa não implica que ele tenha sido frito, exposto ao calor do fogo de uma frigideira onde borbulham opiniões e percepções distintas sobre o mesmo fato. Não importa que tenha sido melado em clara de ovo e banhado com farinha de rosca. Não importa, necessariamente, que se trate de um bife à milanesa.
           Por falar em bife ali na mesma. Já te amarraram ao pé da mesa hoje?
         Cuidado. A pretexto de segurança liberdades foram extintas ou deformadas. Se for verdade o que dizem: sequer notaram a presença da mesa.
           Quer segurança?
            Seja livre.
            Prenda-se a uma mesa.
            Conte suas farpas.

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